Descrição
A escritora afro-americana Toni Morrison, quando questionada sobre a maternidade, afirmou que o lugar de mãe, para as mulheres negras, nunca significou meramente opressão, pois era também um lugar em que projetos de liberdade podiam ser gestados, sonhados e levados a cabo. Além disso, ela acreditava que as mulheres negras deviam prestar atenção às “propriedades ancestrais” que herdaram, o que envolve, principalmente, a capacidade de cuidar não apenas do outro, mas também de si.
Nesse sentido, Oluwa Seyi, nos poemas de seu livro de estreia O que há de autêntico em uma mãe inventada, revela, na verdade, como há tudo de autêntico na mãe que inventa, pois ela é também uma herdeira das propriedades ancestrais. Em seus versos a maternidade se torna não apenas uma inspiração ou um tema, mas o lugar a partir do qual Oluwa materna a sua criança interior, materna a jovem adulta com medo do futuro e, principalmente, parteja palavras como quem deseja parir um mundo em que as vidas negras não sejam interrompidas o tempo todo.
Da poeta que não sabe abandonar a própria carne, uma “casa que me prende/que não é confortável ou quente”, à poeta que afirma “serei, pelos séculos, a mulher da minha vida”, acompanhamos a jornada de alguém que aposta na capacidade e na possibilidade de gerar vida como força e potência da sua existência e de sua poesia. Ao mesmo tempo, é a maternidade que também a assusta e desperta o desejo de jamais dar à luz num país que “mata por capricho/criança que ousa nascer preta”, rogando por Iemanjá, pois “chorarei quando me souber grávida”.
Em seus poemas encontramos, então, uma menina-jovem-mãe que sonha, chora, ama, se cansa, tem medo, tem coragem — virtude que “só cresce em condições adversas” —, mas sem esquecer de se ver “como potência de outras vidas”, rezando e cantando os nomes dos rebentos futuros que, ainda que não nasçam, já vivem em sua poesia. Nada mais autêntico, então, do que a mãe inventada de Oluwa Seyi, uma “mulher parida” que escreve como quem materna.
Sua poesia é, sem dúvidas, sua propriedade ancestral.
Fernanda Silva e Sousa, crítica literária, tradutora e professora
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