Descrição
O poder nem sempre é exercido numa relação hierárquica de dominação e submissão – esta é a tese desenvolvida por Pierre Clastres neste que é um dos mais importantes trabalhos de antropologia política do século XX. Os onze artigos, publicados entre 1962 e 1974, fazem uso do arcabouço teórico desenvolvido por autores franceses como Claude Lévi-Strauss, Michel Foucault. O autor se baseia em estudos etnológicos e em sua vivência com populações indígenas da América do Sul para formular um novo conceito de política. O livro foi uma referência importante no argumento de Mil platôs, de Gilles Deleuze e Félix Guattari. De acordo com a visão corrente na época, as sociedades primitivas seriam desprovidas de uma esfera política por não apresentarem formas de exercício de poder iguais às ocidentais – isto é, as relações hierarquizadas e autoritárias de comando-obediência que normalmente são associadas ao Estado. O autor reivindica uma revolução copérnica que liberte a antropologia desta postura etnocêntrica e possibilite uma interpretação mais ampla das relações de poder, abrindo o caminho para o estudo da política nesses povos. Ao analisar as características da posição do chefe, Clastres defende que a ausência de Estado não é casual. Ao contrário, as sociedades primitivas fazem um esforço ativo de regular as interações do chefe com o grupo, estabelecendo os parâmetros segundo os quais as trocas ocorrerão. Clastres propõe uma inversão da lógica marxista segundo a qual o poder de poucos sobre muitos deriva da desigualdade social; defende, ao contrário, que a desigualdade é uma consequência da atribuição de um poder autoritário a um grupo dominante. Assim, em oposição ao conceito de sociedade sem Estado, ele propõe o de sociedade contra o Estado: sociedades que atuam impedindo a conversão do poder do chefe em autoritarismo. Além do prefácio assinado por Tânia Stolze Lima, etnóloga e professora associada do Departamento de Antropologia da UFF, e Marcio Goldman, professor do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional (UFRJ), a edição inclui uma interessante entrevista com o autor feita por jovens estudantes da revista L’Anti-Mythe, na qual fica evidente seu propósito de ampliar a reflexão sobre a política nas sociedades com Estado a partir de um deslocamento do olhar proveniente da pesquisa etnológica. O texto de orelha é assinado por Sergio Cardoso, professor de filosofia da USP.
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