“Leituras esparramadas”, “livros como guarda-chuvas” e “personagens errantes” são algumas das marcas da relação de Paulo Nazareth com a literatura. Um dos mais consagrados artistas de sua geração, o mineiro, que este ano ganhou a maior mostra de seu trabalho em solo brasileiro – VUADORA, em exibição no Pivô Arte e Pesquisa até 17 de julho –, conta que sua formação literária foi feita a partir de muitos fragmentos.
Na infância, o acesso aos livros era bem mais restrito e seu contato com a leitura se dava, principalmente, através das revistas em quadrinhos do irmão: Turma da Mônica, Pato Donald, Conan, o bárbaro, Mandrake, Fantasma, e por aí vai. Foi na escola que Nazareth começou a ganhar mais intimidade com a literatura, a partir de trechos incluídos em livros didáticos ou com a leitura de clássicos como O guarani, que revisitou (e questionou!) mais tarde. Com o passar dos anos, programas de descentralização da cultura e seu crescente interesse pela investigação de diferentes temas e formas de linguagens o levaram, por exemplo, à poesia de Matsuo Basho e Leminski.
De certa forma, esse modo de ler “fragmentado” da infância ainda acompanha Nazareth. “O livro é quase como um guarda-chuva, que você esquece e pega outro”, compara. Não é de surpreender, portanto, que ele inclua entre seus Livros de Formação alguns desses “guarda-chuvas” perdidos, livros que não terminou de ler, como Um defeito de cor, de Ana Maria Gonçalves, ou livros que não foram terminados pelo autor, como O desaparecido ou Amerika, de Franz Kafka.
Um dos artistas mais consagrados de sua geração, Nazareth leva o binômio arte-vida às últimas consequências. Embora seu trabalho possa se manifestar em vídeo, fotografia e objetos colecionados, seu meio mais forte é o cultivo/construção de relacionamentos com indivíduos que cruzam seu caminho. Ainda que ele acredite que a literatura não tenha impacto direto em seu trabalho – ao menos, não de maneira direta, que ele possa identificar –, fica evidente como os livros que mais o atraem apresentam características e exploram assuntos com os quais ele se identifica e que, não à toa, frequentemente aparecem em suas obras: o ir e vir de personagens errantes cruzando fronteiras e os fantasmas que os assombram ao longo do caminho, histórias atravessadas por outras histórias e pela História, narrativas que expõem estruturas sociais, políticas e afetivas.
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Paulo Nazareth nasceu em Governador Valadares (MG), em 1977. Teve trabalhos expostos na Bienal de Veneza, na Art Basel Miami, e em instituições do mundo todo, como ICA Miami e ICA London, MASP e Museu de Arte da Pampulha.