Jeferson Tenório

Jeferson Tenório

Futuro do pretérito

“Eu cultivava muitos futuros na infância. Hoje, não costumo olhar muito para frente.  Na infância, eu tinha uma imaginação profícua. No entanto, gostava de brincar sozinho. Não interagia com outras crianças. Na foto, apareço em primeiro plano, ao volante de um pedalinho, numa praia qualquer do Rio de Janeiro. Era um raro momento de alegria com minhas primas, minha irmã Ursula (chorando), minha mãe, Dona Sandra, e minhas tias. Era raro porque a vida era tão dura que não nos permitia o direito de sermos alegres com frequência. Lembro que, em meus futuros, imaginava-me um soldado. Imaginava-me num exército. Não sabia bem por que gostava tanto dessa ideia. Entretanto, certo dia, no terreiro de umbanda da Mãe Tereza de Ogum Onira (na foto ela está com lenço na cabeça), em Bangu, no Rio de Janeiro, — um terreiro que minha mãe e minhas tias frequentavam — mãe Tereza jogou os búzios e confirmou que minha cabeça era de Ogum Beira-Mar. Contou-me a história desse orixá. Anos mais tarde, já na vida adulta, não me tornei um soldado. Hoje compreendo que aquele meu anseio de guerra, aquela minha alegria perto do mar, era talvez algum tipo de manifestação de meu orixá. Meu futuro mudou. Não foi o que imaginei. Não estava em meus planos tornar-me escritor, mas forjei minhas próprias armas com as palavras.”

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Quais eram as suas expectativas para o futuro quando era criança? E hoje? Como parte da Temporada no Futuro, a cada semana compartilhamos as lembranças e os anseios de convidados.

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Jeferson Tenório é doutor em teoria literária pela PUCRS, professor na rede pública de ensino de Porto Alegre e escritor. Além de textos adaptados para o teatro e contos traduzidos para outros idiomas, é autor dos romances “O beijo na parede” (2013), “Estela sem Deus” (2018) e “O avesso da pele” (2020).


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